Isabel Grein e sua história dos quinze dias que já duram 5 décadas no combate a desigualdade social e de gênero

Ela foi para um convento para poder estudar. Assim que começou a organização do (MST) – Movimento Sem Terra, em 1978, foi convidada por um grupo de padres franciscanos – que conheceu durante a faculdade, a passar uns 15 dias – ajudando na organização social de um acampamento chamado Encruzilhada Natalina, no Rio Grande do Sul – missão que  passados 50 anos, ainda não terminou.

Depois de mais de 50 anos de atuação dentro dos acampamentos e assentamentos do MST – Movimento Sem Terra, Maria Isabel Grein é tida hoje como uma autoridade dentro do movimento, em função das contribuições dadas, tanto na organização interna que é prioridade em cada temática, como no combate à desigualdade social e principalmente de todos os tipos de violência contra a mulher.
Aos 68 anos, tendo ousado sair de casa em busca de nada menos que conhecimento, aos 14 em 1965, Isabel como é conhecida entre os companheiros do MST, tem formação em magistério no ensino médio e filosofia em nível superior, mas diz que o principal é a vivência intensa no meio social, o que lhe dá propriedade para falar tanto às mulheres como aos homens sobre a importância de resistir e avançar rumo à superação do conservadorismo e machismo opressores, o que de acordo com ela, são os principais instrumentos perversos do capitalismo.
Começando pela desigualdade social, Isabel destaca que o ser humano levou cerca de 1,6 milhões de anos – desde a predominância do gênero homo – para criar as próprias condições de vida, e que a luta pela superação da desigualdade de classes deve ser constante “É uma luta de Davi contra Golias. A luta de classes tem altos e baixos na história. É uma luta conjuntural, estrutural e, sobretudo, desigual em relação ao enfrentamento ao capital, pois só os avanços que a tecnologia da informação proporcionou, é de 5 bilhões de vezes, a partir da velocidade da informação, nos últimos 50 anos”, destaca Isabel, observando otimista que; quando há conscientização há vantagem, pois a população de massa é maioria.

Outra percepção compartilhada por Isabel, vem em relação ao avanço do neoliberalismo no mundo e uma possível destruição de tudo, devido ao que chama de “certas cabeças malucas”, que segundo ela, pode ocorrer de duas formas. uma imediata e outra já em curso. “Penso que podem querer fazer uso da quantidade de hidrogênio ou elementos radioativos já disponíveis, criando bombas de destruição em massa. A outra, que já podemos identificar, é pelo viés da desumanização das pessoas”, contextualiza Isabel, afirmando que o ser humano vem sendo subordinado ao que está posto pelo capitalismo. Pois de acordo com ela, há uma censura que não é muito percebida nas grandes cidades, mas nas pequenas, por exemplo, tem uma elite dominadora para a qual, se os trabalhadores que se organizam são vistos como bandalheiros, ou seja, é uma vergonha se os trabalhadores se organizarem e lutarem por seus direitos. “Há uma ideia de que coisa boa para o trabalhador é só trabalhar”, enfatiza, dizendo acreditar que o meio pelo qual ajuda os pobres e a classe trabalhadora que está sem saída a compreender e reagir, é pela capacidade que tem de se comunicar de maneira simples com essas pessoas, conforme aprendeu pelas orientações de Paulo Freire.

O patriarcado repercutido no machismo atual que segue a serviço do capitalismo, explorando trabalhadores e oprimindo as mulheres – Isabel lembra que atualmente, o número de lares conduzidos por mulheres é de mais de 60%, conforme IBGE (2017). Existem diversos tipos de famílias, observa. Algumas estão dentro do homossexualismo masculino, outras do homossexualismo feminino, em algumas só a mãe sozinha cuida do lar, outras poucas o pai sozinho, e há ainda muitas, que a avó cuida. Entretanto, aquelas famílias não héteros que são diferentes do que sociedade tradicional reconhece, são vistas como um problema. Pois é defendido dentro da família tradicional, que não se deve discutir gênero nem religião.
A partir do contexto exposto, Isabel diz que a reflexão precisa ser sobre os objetivos perseguidos, que é manter a ideologia das sociedades patriarcais e de classes. “Precisamos ter claro o modelo de sociedade que queremos lá adiante, mesmo que não seja para a nossa geração que já está vendo alguns sinais das mudanças que queremos. E para tanto é preciso que a classe trabalhadora compreenda que tanto o patriarcado como a sociedade classista tornam-na prisioneira de seus interesses”.
A serviço de quem está a classe trabalhadora e a quem interessa o patriarcado por exemplo, se não ao capitalismo? pergunta Isabel, complementando: “O patriarcado tem a função de manter a sociedade de classes e vice versa – um se alimenta do outro como num processo de simbiose – mas em relação à classe trabalhadora, ambos se comportam como parasitas que grudam numa arvore e sugam-lhe a seiva até o definhamento”, exemplifica Isabel, acrescentando: “Nós não vamos vencer o patriarcado que se sustenta na sociedade de classes nem em 50 nem em 100 anos. Mas precisamos fazer a mudança agora e sem parar, pois é a partir das reflexões que fazemos com homens e mulheres em encontros que precisamos promover constantemente, que as mulheres ficam um pouquinho mais em pé, e os homens vão ficando mais humanizados.”
Ao discorrer sobre as consequências das práticas machistas, Isabel diz que após as formações que orienta dentro das organizações e movimentos sociais, vai se compreendendo que os principais prejudicados com o machismo que tem origem no patriarcado capitalista são os próprios homens. “Porque as mulheres tem a possibilidade de se libertar e os homens não se libertam se suas companheiras não se libertarem. É esta compreensão que levamos tanto às mulheres como aos companheiros homens. Isto gera empatia entre ambos sem segregar os gêneros”, completa a filosofa e militante, perguntando e respondendo: “Afinal, qual o papel do feminino na História, se não, sobretudo, o de defender a vida? Foi por isso, que diante da invasão dos agrotóxicos que está prejudicando todos os tipos de vida, as mulheres foram as primeiras a protestar, destruindo pesquisas de monocultura em universidades do RS e canteiros de mudas de eucaliptos no PR”. Embora uns tenham entendido de um jeito, outros de outro, Isabel garante que o propósito da mensagem foi em defesa da vida, e que é por esse princípio que está mais no feminino –  referindo-se à sensibilidade, ao cuidado e zelo pela totalidade – que homens e mulheres devem lutar para que o modelo e atitudes que preservem a vida, prevaleçam.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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